Assim como é

por Frederico Coelho

“Quem não gosta de ser desejado por quem desejamos? Quando o interesse é mútuo, podemos ter orgulho de quem somos, pois o olhar do desejante nos confirma essa frágil verdade interior de que somos alguém e esse alguém tem valor.

Mas para quem esta no caminho do conhecimento de si, muito melhor do que a paixão de um outro é a sua rejeição. Ainda mais se for daquelas bem vagas e paradoxais do tipo “você é uma das pessoas mais interessantes e fantásticas que já conheci, mas não te quero.”

Se fosse por uma característica física você poderia culpar a vida ou fazer uma plástica, se fosse por algo da sua personalidade, você poderia contratar um coach pra te ajudar a fazer uma mudança de ‘mindset’ e pedir uma nova chance. Enfim, você poderia resolver a questão. Mas quando não é por nada disso – pelo menos não confessadamente -, então essa pessoa esta te dando um presente precioso: um espinho na carne do teu senso de eu.

Você poderá aproveitar a sensação de eu ferido para perceber e se conectar com o seu impulso compassivo de se livrar do sofrimento e ser feliz, latejando de tão vivo – ‘se eu estivesse com ela certamente seria mais feliz’ -; impulso esse que também te ajuda a compreender que a pessoa que te rejeitou fez isso irmanada pela mesma motivação.
 
Você sentirá nas entranhas literais e metafóricas o alto custo de investir esse impulso na incerta aceitação de seu eu por um mundo externo alheio aos seus gostos e esperanças.
 
E, por fim, vai poder investigar, a partir de um exercício contemplativo, o quão real é essa sensação, agora tão presente, de existir como alguém sólido, permanente ou se ela não passa de uma contração mental na tentativa de lidar com o fluxo vital e impermanente da vida, como uma respiração que esquecemos presa depois de lidar com alguma tensão. Se assim o for, que boa nova, só precisamos nos deixar expirar e tudo estará perfeito, assim como é.

O Coemergência se propõe a explorar temas importantes da nossa sociedade e da vida cotidiana, sempre à luz da relação entre os nossos mundos interno e externo. Partimos do princípio de que a maneira como percebemos e nos posicionamos no mundo está diretamente relacionada aos nossos referenciais, visões de mundo, emoções, hábitos e experiências prévias.

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